amor à camisola
Logo à noite, perto da meia noite, estarei, finalmente, a chegar a casa depois de mais um treino. Provavelmente, quando chegar a casa, queixar-me-ei do braço que doí, do corpo que pede cama e dos joelhos que estão esfolados. Cairei na cama, exausta, para acordar no dia seguinte, cedíssimo, para mais um dia de trabalho que terminará, também ele, perto da meia noite, depois de mais um treino, em que, provavelmente, me continuarei a queixar de tudo o que me queixei no dia anterior.
As pessoas que me são próximas dizem que vivo para aquilo. Outras, menos próximas, perguntam como tenho tempo para tudo. Há quem faça birras porque não vou, porque tenho jogo, porque na verdade o tempo não chega para tudo e priorizo.
Dou por mim a sorrir.
Não me lembro como é que isto começou. Sei que tinha uns 8 ou 9 anos, quando, por algum motivo (provavelmente levada pelo professor de educação física) entrei no mundo do voleibol. Também não me recordo, mas duvido que soubesse para o que ia e no que aquilo que se ia tornar para mim.
Sem dar por ela, o que era suposto ser um hobbie, rapidamente deixou de ser apenas isso. Treinava todos os dias. Jogava, aos fins de semana, em dois campeonatos distintos. Passava mais tempo com a Equipa do que com a minha família.
Vivia intensamente cada treino, cada jogo, cada campeonato. Sentia a ansiedade, a importância “daquele” jogo. Gritava cada ponto! Vibrava com cada vitória.
Joguei algumas vezes com dores, outras com mau estar, outras ainda com cansaço. Joguei com tudo isso ao mesmo tempo. Joguei com alegria, com satisfação, com vontade. Com garra! Com prazer. Acima de tudo, com prazer.
Entrei em cada jogo para sair apenas com a vitória. E há derrotas que ainda hoje estão presas na garganta.
Ontem, após alguns anos de pausa, porque a vida (porque nem sempre é possível priorizar como queremos) assim me impôs, regressei, oficialmente, a este mundo. A um mundo que, apesar das pessoas não perceberem, tanto me dá.
Hoje, tantos anos depois do primeiro dia, sinto tudo da mesma forma, com a mesma intensidade. E sei, desde já, que vou continuar a jogar com dores, a sentir a ansiedade, a vibrar com cada ponto, a viver cada vitória como se tudo se resumisse àquilo.
Infelizmente, e sob protesto, sei também que vão continuar a existir jogos que me ficarão presos na garganta. Que a frustração vai fazer parte. E que nem sempre os resultados vão ajudar a acalmar as dores ou o cansaço.
Mas de uma coisa tenho a certeza, vou continuar a jogar com prazer. Porque apesar de todo o esforço que isso me exige, de todas as coisas que me faz “não fazer”, de todos os lugares onde não poderei estar e de todas as opções que vou tomar em prol do voleibol, aquela equipa (que apesar do pouco tempo já é tão minha), aquele clube, dentro daquele campo, me vão fazer tão feliz! Mas tão feliz!
E o braço vai continuar a doer, e o corpo vai continuar a pedir cama, e os joelhos vão continuar esfolados. E eu vou ser tão feliz mesmo assim.
M.